domingo, 26 de dezembro de 2010

Crônica natalina


O Natal é uma data muito especial, concordam? O evento pré-estabelecido mais popular de nossa cultura cristã. Adorado, principalmente, pelo setor comerciário, o natal é conhecido por ser um tempo de paz, amor...

Natal é tempo de despreendimento! Vamos às compras!

Você resolve comprar algum calçado. Entra numa loja apinhada de gente e logo se irrita porque nada tem preço. Procura um vendedor que está atendando mais 4 pessoas. Ele diz que já vai trazer os seus sapatos. Ele volta 15 minutos depois. Natal é tempo de compreensão! Você experimenta e precisa de um número menor. Espera mais 10 minutos porque o vendedor foi para o estoque e desapareceu por lá. Ele volta, voce faz o novo pedido. Após mais 15 minutos ele trás o sapato requerido, mas, que pena!, não tem mais na cor azul. Cresce um sentimento de revolta, você não precisa de uma sapatilha amarela e sim de uma azul. Mas natal é tempo de reflexão! Você pensa que depois de passar quase 1 hora nessa loja tem que comprar alguma coisa! Você sai com uma sapatilha amarela que nunca quis comprar, mas tudo bem! afinal, eles parcelaram em 4 vezes sem juros. O Natal é tempo de caridade!

Natal também é tempo de união entre as pessoas!

Você volta exausta e cheia de sacolas. Percebe que a fila para pegar um ônibus vai até o meio do terminal. Então, vamos em pé mesmo. O ônibus está lotado e faz muito calor. O idiota do motorista para em todos os pontos sabendo que não cabe mais ninguém no ônibus. As pessoas xingam o motorista. Um homem sobe no ônibus, não consegue entrar, óbvio!, e vai pendurado na porta. Ele diz que se o motorista fechar a porta comprará um problema com ele. As pessoas xingam a mãe do motorista. Um passageiro que estava sentado se oferece para segurar minhas sacolas. é natal. Natal é tempo de solidariedade!

Natal é tempo de sinceridade!

Você compra presentes para os seus familiares por um site da internet. Eles prometem entrega em até 1 semana. Você está tranquila, efetuou a compra com 2 semanas de antecedência. Os dias passam e nem sinal da sua encomenda. Voce já começa a se preocupar. Manda um e-mail para a central de atendimento. No mesmo dia chega uma resposta: "Esta é uma mensagem automática de nossos servidores. Por favor, não responda. Recebemos seu contato e pedimos gentilmente que aguarde o retorno em breve." Natal é tempo de gentileza! Então você aguarda gentilmente o retorno. Não há retorno. Os presentes não chegam. É noite de natal. Você explica sem graça que não trouxe presente para ninguém porque a droga do site não enviou a tempo. Escreve um e-mail nada gentil para a empresa.

Natal é tempo de encontro.

Família reunida! Trocam presentes, se enchem de peru e rabanada, falam mal da parente que não veio, assistem o especial da Xuxa e ouvem pela milésima vez o CD natalino da Simone. E a música lança a perspicaz pergunta: "Então, é natal. E o que a gente fez? O ano termina e nasce outra vez."

Apesar das ironias do natal, para mim esta é, de fato, uma data muito especial. Um feriado socialmente instituído para que abracemos uns aos outros sem constrangimento, sem parecermos bobos. E, como diz minha tia Neide, existe uma energia que flui entre as pessoas e devemos sempre nos cercar de pessoas que nos desejem feliz natal, saúde, paz. Esse é o sentido do natal. As pessoas que celebram a vida, desejando mutuamente uma paz que só encontram no momento do abraço.

Feliz natal (atrasado!)!

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Amai-vos uns aos outros


"Que bela imagem nos chega de Barcelona, uma imensa fila de casais gays se beijando à passagem de Bento XVI. É tocante a imagem. Uma bela forma de protesto aos discursos retrógrados do papa, condenando a união homossexual e qualquer outra forma de amor não ortodoxo. As bobagens ditas pelo papa contra o uso de preservativos, por exemplo, beiram a irresponsabilidade. Não adianta que me falem de dogmas, ou de palavras proferidas em desertos por profetas ancestrais. Que se queira acreditar em virgens que procriam ou homens que caminham sobre as águas, tudo bem. Mas a mim, tudo isso parece uma grande bobagem que se leva a sério demais. E que acaba por desrespeitar alguns dos aspectos mais belos de nossa natureza humana, como o amor, exuberante e poderoso, imune às interpretações redutoras e moralistas das religiões.
Só posso me regozijar com as fotos que chegam de Barcelona, nas imediações da belíssima catedral projetada por Gaudí, cujo nome significativo, Sagrada Família, poderia ser compreendido por Bento XVI como uma dica de que a família, por mais sagrada, também muda e se transforma. Como tudo nesse mundo. Que os caminhos de Bento XVI sejam inundados por homens beijando homens e mulheres beijando mulheres. Que o amor atropele o papamóvel com a força transformadora da mudança. Que os beijos gays possam iluminar o papa, e que o façam lembrar-se das palavras do Cristo: Amai-vos uns aos outros.
Uma imagem, afinal, vale por mil palavras."

De Tony Bellotto
In: http://veja.abril.com.br/blog/cenas-urbanas/

Bem, e depois dessas sábias palavras do Bellotto eu só assino embaixo! hahah

domingo, 3 de outubro de 2010

Eleição de mentira

Acabo de exercer o meu direito obrigatório de votar. Disseram-me que tudo é discurso, e bem sei que discurso também é política e ideologia. Gostaria de transgredir os limites fantasiosos de direita e esquerda... hoje votei verde.
Tantos mas tantos papeis esparremados pelo chão com rostos e números dos respectivos políticos misturando-se a lama das ruas. Sujas ruas, boicote a lei que proibe a panfletagem no dia da eleição. Lembraram-me que a democracia que tanto nos orgulha aqui no Brasil é um teatro. Ofertam-nos personagens coadjuvantes nessa peça. Os protagonistas respondem aos que pagaram pelos papéis com suas caras bonitas na lama, não a nós.


No caminho com Maiakovski de Eduardo Alves da Costa

(...) Tu sabes, conheces melhor do que eu a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores, matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.

(...)

Vamos ao campo e não os vemos ao nosso lado, no plantio.
Mas ao tempo da colheita lá estão
e acabam por nos roubar até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso defender nossos lares
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre nós que marcham os soldados.
E por temor eu me calo,
por temor aceito a condição de falso democrata
e rotulo meus gestos com a palavra liberdade,
procurando, num sorriso, esconder minha dor diante de meus superiores.
Mas dentro de mim, com a potência de um milhão de vozes,
o coração grita - MENTIRA!

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Rotas

Uma rota de fuga
Uma rota de colisão.

Ouço os malditos entoarem choro e riso:
Todos culpados, todos juízes.
Por vezes colidem com o roteiro de meus passos curtos,
Encurtam meus dias.
Em vidro translúcido me prendem
Eu vejo que é pelo medo e que de nada adianta
Uma prisão que desprotege o dentro e fora
Soltos como bichos.
Partimos e nunca chegamos.

E todos caminham tão rápido
E todas são as direções
Vamos nos perdendo uns nos outros
Como espelhos colidindo

No fim tudo é poeira branca,
Nem cacos
Rotas de fuga para a colisão.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

A Manhã

Nossos corpos, uma manhã
Despertamos para ansiar o dia
Impuros. Um quadro torto.
A face, os membros e a língua
Tudo atravessado por dentes e lábios
Que de juventude e sonhos preferimos não
O não saber, não dizer, só estar.
O não-dito dizendo sinceras elegias
A lástima do nascimento do novo
Em receoso buraco.

E era uma bela manhã de julho.
E fechava o mês
E abria caminhos
E reticenciava sentimentos.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Socorro, não estou sentindo nada

Eu quis ser simples, não amar demais, não correr atrás de respostas. Fui caminhando devagar a passos leves, tomando cuidado para não pousar o pé em canto algum por demasiado tempo. Inventei a seguinte fórmula: encarar com sensatez e cautela o duradouro, enquanto que, em contrapartida, o passageiro seria o locus do extravasamento. Acho incrível como tamanho desequilíbrio pôde me levar a uma estável zona de conforto.

Admito que minhas desventuras não dariam nem boas notas de rodapé. Venho ensinando-me a conviver intimamente comigo, minhas palavras e nada mais; talvez, por isso, pressinto que elas perdem força. Sinto falta do desespero que te assalta o peito, do vergonhoso choro no ônibus só porque ele não disse as palavras certas, dos devaneios constantes, do poema de amor mal feito no meio da madrugada, da dor lancinante de querer fugir e sentir-se paralisada sabendo que o outro já está a léguas de distância. Que falta faz o abstrato.

Hoje eu me mexo quando e para onde prover, não reclamo, mas vejo-me muito concreta. Peço a Cássia Eller sua música emprestada para cantar o meu momento:

"Socorro - Cássia Eller
Socorro, não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar, nem pra rir
Socorro, alguma alma, mesmo que penada
Me entregue suas penas
Já não sinto amor, nem dor, já não sinto nada
Socorro, alguém me dê um coração
Que esse já não bate, nem apanha
Por favor, uma emoção pequena
Qualquer coisa
Qualquer coisa que se sinta
Em tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Socorro, alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento, acostamento, encruzilhada
Socorro, eu já não sinto nada, nada"


Gostaria de ser menos meta, seta, linha reta, afinal talvez o alvo nem me espere, como diria Paulinho Moska. Quero dizer “eu te amo”, quero me arrepender de ter dito.
Porque, cara, o ser humano é uma loucura mesmo. É estabelecer-se no ápice do contraponto, na iminência da mudança. Sinonimizamos o vazio e o completo, o certo e o errado, eles não nos servem. O que importa é jogar-se nesse jogo de quebrar, é estar em processo.

domingo, 13 de junho de 2010

O papel do artista


Hoje, na aula de teatro, conversamos sobre o papel do artista. Falamos sobre a magia da arte, do poder de seduzir, de provocar encantamento. E da sua função política, como veículo de reflexão crítica sobre o humano e seu meio.

Outro papel muito importante do artista é o de incomodar. O que por vezes passa despercebido ecoa aos olhos do artista, fazendo da arte o mistério daquilo que já conhecemos. Nas mãos do artista uma rosa não é só uma rosa, se transmuta em uma arma de espinhos ou em um beijo de pétalas. Por isso, se eu tivesse que traduzir a arte em um só sentimento, este seria o da perplexidade ante o cotidiano. O artista é aquele que sente o estranhamento como um estado constante de alma. Um ser inconformado que vaga em busca de significação. A lucidez do artista beira a loucura, penso. Enxergar além tem um preço, principalmente, quando se tem a consciência de que nunca se enxerga o bastante. Afinal, todo ponto de vista é a vista de um ponto (Leonardo Boff).

A vida é um jogo de regras relativamente estáveis. Começa assim que você entra em cena, cada passo seu repercute no jogo e você vai desenvolvendo seus movimentos na troca com o outro, dentro das condições de possibilidades do meio. A gente vai se percebendo nesse espaço, construindo um personagem que nunca é um mesmo. O existir vai se tornando habitual.

O que me lembra um poema interessante de R. D. Laing, assim:

“Eles estão jogando o jogo deles.
Eles estão jogando de não jogar um jogo.
Se eu lhes mostrar que os vejo tal qual eles estão,
quebrarei as regras do seu jogo
e receberei a sua punição.
O que eu devo, pois, é jogar o jogo deles,
o jogo de não ver o jogo que eles jogam.”

Então o teatro burla essa regra do jogo, pois que é feito uma metavida.

O que te incomoda? Quais são as suas questões?, perguntou meu professor de teatro.
Por hoje essa é questão que me sorveu o dia: Qual é o papel do artista? ou melhor..

Qual é o meu papel e o da minha arte?

Bem, espero ter incomodado vocês, leitores. :)

domingo, 6 de junho de 2010

Breve excursão interior


Pedaços pelo chão querem me compor: sou música. Sou um rítmo em descompasso que caminha em diagonal. Sou narrador-personagem, que ludibria, que quer ser lida. Sou a tentativa de descobrir, conhecer. sempre o processo, o meio, o imperfeito. Eu quero questionar o que dizem os poemas e as armas químicas. Costurar perspectivas e implodir qualquer certeza. Sou uma pintura cubista.


Sou o que vem depois da vírgula,

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Tragédia e Comédia

Hoje fui a um funeral. Senti a dor e tentei confortar uma amiga. Eu ali, no auge da compaixão e debruçada a olhar para o meu próprio umbigo: e se fosse comigo? Ser humano. O mais primórdio instinto: a busca pela sobrevivência que remete ao egoísmo. Creio que minha compaixão era deveras sincera, mas ao vê-la era um ser humano que eu enxergava, impotente na sua angústia, refletindo a minha impotência por tentar secar suas lágrimas não findáveis. Tão parecido comigo. Dá tanto medo de sentir dor.

"A vida é um grande teatro”, pensando agora nos gregos e nas duas máscaras que caracterizam o gênero: tragédia e comédia. Creio que seja a impossibilidade de riso frouxo que faz das piadas de velório as melhores. Será coincidência? Ou por que naqueles momentos de maior apreensão é que nos assolam risadinhas nervosas? Teorias explicariam que liberamos algum hormônio e blablablá.

Mas, amigos, fiquem sabendo que vocês estão encarregados de promover o primeiro Funeral o Mundo a Festa* de todos os tempos. Eu falo sério, gosto da ideia de um funeral com música da Lady Gaga, queijo no meio para dançar e, é claro, bebida liberada, tipo Cine Ideal mesmo. É, nada de choro nem vela. AAAh e não se esqueçam de espalhar os meus poemas por todo o lado.

Que tal instituirmos uma nova regra social na qual fica acordado que em todo velório o parente ou amigo do defunto deve trazer uma foto em que esteja com ele ou ela, e contar a todos porque aquele foi um momento especial? Ou trazer um recorte, uma música? A graça consiste sempre na criatividade. Resignificaríamos a dor, que, aliás, dor ainda seria.
Choro e riso.
Vivemos sob o signo enigmático das máscaras do teatro grego... e a vida é mesmo uma síntese dialética dos opostos (barroco! oh) (claras influências de Fernando M. de Barros! rs).

quinta-feira, 29 de abril de 2010

inventei que o vento me invertia

inventei que o vento me invertia,
escrevi que o crível me recriava,
calculei o canudo que me cabia,
inspirei o poema que me respirava.

é meu modo de mordiscar a coleira,
porque não me fiz frágil nem freira,
parti desde o parto para essa estrada
sem licença para de seda laços
mas de pau e pedra e canetada.

cigana que não se engana nas artimanhas
só espera a espreita enquanto estranha.
para voltar envolta de início
a inventar vento malício.
entoando odes ao ocioso ciclo.

domingo, 18 de abril de 2010

Fim do sonho

Macacos me mordam!
Os céus caíram.
O caos para meu interior mudou-se.
Se não há sentido em buscar o pote,
Aquele do arco-íris
Então não lhe devo confiar
Meu desvario, minha paixão
Posto que a razão lhe presenteio?
Que não se engana com falsos galanteios
Que te avalia, te cansa.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Ensaio sobre a minha cegueira

Entendi que as águas de abril não foram um castigo. A chuva não explica a tragédia. A vida do pobre é de sonho e de lama. É de pedra e é de suor salgado que não substitui a lágrima. É a vida no precipício, construindo casa em área de risco. É a autoridade aplaudindo, o auxílio social camuflando a venda de votos. É pau é pedra é o fim do caminho, é mais casa regulamentada para cobrar IPTU.

"Me disseram porém que eu viesse aqui pra pedir de romaria e prece paz dos desaventos". Preferi escrever a denúncia. Sou culpada. Todos são. Fechamos os olhos para uma verdade que nunca esteve escondida. E trocamos palavras vazias de “oh, que horror, quanta gente morta, meu Deus!”. Surpresos? Somos a parcela da população mais apta a ler a política pública e denunciar o descaso. Mas a vida é bem mais complicada que isso. Vivemos pela individualidade, apesar de construirmos nossos discursos e identidades socialmente. Faço parte dessa confusão e dessa gente que não se respeita. Como cantava Renato Russo: a culpa é de quem? A culpa é de quem? Não serei menos culpada ao postar esse texto. Tampouco quero ocultar o meu alívio por estar viva e minha casa de pé _ que bom que não nasci miserável!.

Por que a mídia só agora aborda o problema da indústria da favelização por esse ângulo? Que na favela tem bandido, droga e muita gente carente todo mundo já sabe. Então a Veja lança a pergunta: “Quantas tragédias ainda ocorrerão até que o Rio de Janeiro descubra suas fragilidades?” Mas era mesmo preciso uma tragédia para tal? Afinal, que aqueles barraquinhos empilhados uns sobre os outros encravados nas encostas dos morros estavam sujeitos a um iminente colapso, bem, era evidente. Até mesmo elementar, não?, via-se a olho nu. A Veja culpa os governantes, o governante diz que não sabia que a favela havia sido erguida sobre um lixão e eu, eu que tantas vezes passei de ônibus em frente a ela, eu virei para o outro lado enquanto ouvia meu mp3.

Hoje me sinto impotente, estou de mãos atadas, e o melhor que posso fazer só remedia o desconforto mas não a dor daqueles. Todavia estou doando roupa, sapatos, alimentos e só. Não tenho esperança para doar. Creio que nunca haverá igualdade social porque o homem não quer ser igual.

“How many times can a man turn his head, and pretend that he just doesn’t see? The answer, my friend, is blowin’ in the wind. The answer is blowin’ in the wind.”

Bob Dylan nos contou que a resposta está "soprando ao vento". Hoje o homem mede a intensidade do vento e conhece seu curso, no entanto, mesmo com toda a tecnologia, ainda somos incapazes de parar para sentir e escutar o vento.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Cidade

É de graça? É?
Quanto custa esse pão?
Um pão mofado pra eu comer.
Que nem tem vida, nem um centavo de centeio.
Não existe um pão, ele é o símbolo da falta.
Isso.
O pão é abstrato!
O abstrato é ausente?
Não seja idiota, você não precisa de pão.
Você é um monumento.
Concreto concreto.
Aqui todas as pessoas sentem muita raiva.
Muita raiva.
Me pixaram todo.
Então morri de fome.

sábado, 3 de abril de 2010

Amizade

Enquanto caminhava pelas ruas do centro da cidade, Liana topou com Carla. Era inevitável agora parar para cumprimentar a velha amiga. Parou, tentava sorrir. Ouviu a pergunta distante: “tudo bem com você?”.
Respirou fundo, refletiu se deveria responder sinceramente. Se resolvesse pela sinceridade, responderia assim: “Eu sinto a incerteza. Em nada ter cor nem razão, sem motivo algum para soprar as nuvens. Deixei o meu dia nublar e o Sol encobrir, que é melhor assim. Eu preciso de um tempo! Preciso me afastar de tudo, viu? Eu só quero me conhecer um pouco. Ah minha amiga, você se lembra do que já passamos juntas, lembra-se bem? Eu ainda guardo os seus segredos, ainda conheço você. É só uma viagem, talvez nem seja longa, mas você já põe alguém em meu lugar. Mas ela também lhe serve, não? Todas as amizades são efêmeras, se não regar a intimidade. A minha ausência traz aridez e estranhamento, eu sei. Eu espero voltar um dia, eu espero que nada venha a mudar. E eu sei que vai.”
Mas Liana preferiu dizer que estava muito bem, e como estava o Pedro? O Pedro estava ótimo, é claro, muito bem na empresa, alguém tinha que pagar o cartão de crédito dela, disse Carla. Carla sempre fora assim, meio extravagante. Será que ela ignorava o espaço entre elas? Não, ela sabia, mas optava pela cegueira da superficialidade. Quem era Carla afinal? Uma grande amiga de Liana, da época de faculdade, seus mais memoráveis anos. Mas quem era Carla hoje?
Liana não pretendia estreitar laços quaisquer com ninguém naquele momento, no entanto, apesar da tagarelice e egoísmo irritante de Carla, ela já sentia uma espécie de saudades de simplesmente tê-la ali a sua frente. Que falta é capaz de nos fazer as trocas de favores que são as relações humanas, que falta meu Deus! desses sereszinhos humanos, que dependem e grudam na gente. Se Carla fosse menos tonta ela lhe perguntaria: “De quem você depende, minha amiga?” Certamente não era mais dela. Carla tinha Suzane. Vejo que vampirizar relações também é profissão de gente.
Carla enveredou a falar sobre a mãe do Pedro, isso seria muito mais longo do que Liana queria suportar. Ela fitou aquela amiga que não mais a conhecia. Uma estranha. Quis lhe confessar seus sentimentos e dúvidas, falar tudo de uma vez. Então Carla disse que estava indo ao shopping encontrar Suzane, Liana podia ir junto, pegariam um cineminha. Vejam como simples é a substituição. Liana não queria ir a cinema nenhum e tampouco lhe contar mais nada. Sendo assim, nada disse e tudo ficou para ser dito nunca.
Despediu-se, tinha que encontrar o banco aberto, e antes de partir deixou que seu olhar lhe segredasse: “Desprenda aqueles que você ama, deixe-os livres, acabará sem nenhum deles.”
E seguiu.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

A carta esquecida que nunca enviei


Dos verbos que conjuguei sempre quis ser sujeito ativo. Não prever sua influência foi um erro. Na minha mente, você: um objeto, aqui e ali, sempre perto, tão indireto. Dos verbos que conjuguei, ah, tantos foram regenciados por você. Saiba que sorri, escrevi, abracei, fugi, rasguei, esqueci, reli, chorei, gritei, fui, voltei. Amei, eu amei tanto. Venho lhe dizer que faltou um verbo, você percebe? Acredite, esse verbo tem o poder de conferir sentido aos demais ou fazer desmoronar tudo sobre nós. Ora sempre haverá duvidas e, talvez, ressentimentos. Observei toda essa parte de minha vida com cautela até aqui, mas não a vivi. Não se vive uma história de amor sozinho, afinal. Nós não vivemos a nossa, nunca. O verbo que nos falta: viver. Viver um amor é difícil, eu sei. Requer dois sujeitos unificados, sintonizados. Mas me cansei de amar em vão.
Sintaxe meu complemento, pois hoje eu quero te amar absurdamente, pra valer. Vamos viver a história que começamos a pincelar há tantos anos atrás? Pode resultar em um quadro ou em uma grande exposição. Saberemos amanhã.

Thamiris Araujo. 22/10/2008

sexta-feira, 5 de março de 2010

Lamentação.



Em nuvens cor de ébano os anjos se tocam.
Miram-me, provocam.
Proclamam com suas trombetas douradas o meu jugo.

__ Eu não sou senhor de mim. Eu me rendo. Eu me vendo.
Em seus olhos não há compaixão, mas volúpia.
__ Já para o túmulo, onde a carne podre fica.

Caminho para o túmulo. Não há mais túmulo.
Apodreço no fogo morto de um desgosto eterno.

Joana Vogst. (24/02/2010)

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Beijei um cara da Groelândia.


Acho que já contei para muitos dos meus amigos: nesse carnaval eu beijei um cara da Groelândia! Nem preciso dizer que ele reunia todas as características de um príncipe dos desenhos da Disney: louro, alto, de profundos olhos azuis e um sorriso branco. Sabe como é passar o carnaval no rio, não sabem? Bem, você conhece um zilhão de pessoas, até troca telefone! Mas depois da quarta-de-cinzas você nem se lembra a quem pertence aqueles nomes não conhecidos na sua agenda. Amizades e amores de carnaval... intensos e fugazes como tempestades.

O beijo de um groelandês é MUITO diferente! Sim, eu o denomino pela nacionalidade mesmo, por razões óbvias, não me lembro o nome do dito cujo!, e talvez eu nunca soubera. Eu sentei perto dele e puxei assunto, simples. Agora reflito como parece uma violência fora dessa data, tamanha abrupta intromissão. Ora, carnaval êe! O que me lembra a camisa de um amigo que traz a seguinte frase: “Vodca: connecting people.” O belo rapaz me recebeu muito bem com os seus sorrisos (aquela altura da noite eu já via mais de um sorriso), e falava um inglês embolado, tanto que não entendi de imediato de onde ele era. “Finland?, Greekland???, ah in Europe? Okay, depois eu procuro no google maps.”. Meu príncipe era de Greenland, sim, ironicamente, terra verde, afinal, lá praticamente só existe gelo! Eu pesquisei no google!! Chega a 25 graus negativos em seus invernos secos. A população é de 55.000 a 60.000 habitantes, (contando os cientistas não fixos).



Nem me lembro do que conversamos, pois não fora um assunto extenso, e agora me arrependo disso. Quanta coisa gostaria de ter perguntado ao meu lindo groenlandês! Poderíamos ter vivido uma rica troca cultural; me interessaria saber sobre seu idioma pátrio, o clima gélido, como é viver em um país quase não habitado, o que ele inclui em sua rotina e hobbies, as lendas ou mitologias esquimós, etc. No entanto, uma coisa eu aprendi: Groelandeses não beijam de língua! :O um absurdo, não é?!! Pelo menos para um brasileiro, onde já se viu beijo sem ela que é protagonista! Então eu disse a ele: “use your tongue”, e ele me olhou como se não compreendesse a que eu estava me referindo, pacientemente eu lhe expliquei: “like this”, e introduzi minha língua na boca dele. E, felizmente, nossas línguas se entrosaram muito bem.

Moral da história: Não saia beijando um estrangeiro antes de perguntar-lhe tudo o que você queira saber sobre as especificidades de sua terra. Ora, vivemos em um país turístico, devemos tirar algum proveito disso!

Oh, quantos tesouros estão espalhados por esse mundo, de vez longe de minhas ávidas e curiosas mãos: conhecimentoS.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O não-doce do algodão


A insegurança me prende as pessoas, é fato.
O algodão-doce cor de rosa tem sabor enjoativo,
A moldura dos sorrisos não me atrai.
Nem me atreveria a amar o amor deles.
O amor é pleno e eterno, e eu admito eu grito
EU NÃO SOU EU NÃO SOU.

Amor? ele não existe.
O que existe é o egoísmo humano
Meu egoísmo fracassado de quem quer dizer loucuras
Quer dizer verdades que não quer ouvir. Quer dizer que não quer amar quando ama.
Então escreve: “eu não gosto de ninguém, exceto de mim mesma”

Mas enfim, insisto em recordar daquele que não me tem amor
Que do core não sai, ele não sai daqui.
E não quer ouvir meus loucos versos.
Mas eu verso: “é a insegurança querido, nada tem a ver com metade da laranja”
Odeio laranjas!

Eles dizem que posso amar também, mas não.
Obrigada, mas hoje não, quem sabe um dia...
Porque amor não é entidade da bondade universal.
Amor é só amor, e fim de papo.