terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Muda resistência de rosa.

Estática - Foi como me encontrei
Querendo as respostas de uma vida em um único momento.
O momento único é quando lhe roubam a vaidade,
E você sente sua carne exposta.
Eles jogam sua carne ao sol para os pássaros.
Animais roem e cospem.

Vermelho
Uma paisagem vermelho-sangue
Ali, nua, sem brios: rosa despetalada.
Dissimule seus valores, vamos!
A orquestra é repugnante e você já perdeu tudo.

Alegorias em meu jardim.
Uma rosa roubada pergunta aos pássaros:
__ Se vocês não entendem, por que consomem?

Estáticos.



[Joana Vogts: meu heterônimo!]
obs: esse poema nasceu após roubarem o meu orkut! ¬¬ rsrs

domingo, 18 de outubro de 2009

Momento particular de dois

[Já sei o que você vão dizer: "ele é tão você" rsrs, E eu vou concordar, ele é o que eu sou, o que eu sinto e senti. É Thamiriano (termo inventado por Rodrigo!) Me aproveitando da ideia de Carlos e seu texto nostálgico, a minha memória: "fatos reais "vestidos" de um pouco de ficção". Espero que aproveitem. kisses;]

É uma pena não podermos estar de mãos dadas caminhando pela praia agora. E você me abraçar, roçar seus lábios na minha bochecha, que logo fica vermelha e dá espaço para a minha boca. Minha boca procura a sua e nossos narizes ficam se tocando ao mesmo tempo em que você segura minha mão com força, entrelaçando os nossos dedos. Acabamos por nos beijar. Como duas crianças bobas, vamos girando a língua, girando e girando. Quem vai parar primeiro? Você pára e segura meu rosto com a palma das mãos. Quando você me olha assim eu fico achando que você me ama.
Agora você largou o meu rosto e está olhando o mar. Eu sei que você adora o mar, mas fico com um pouco de ciúmes. Eu sento na areia e você senta ao meu lado. Pousa as mãos sobre as minhas e, depressa, busco entrelaçar nossos dedos. Dá certo, porque você passa a examinar a minha mão esquerda. Fica rindo porque eu tenho as mãos tão pequenas. Eu rio também. O seu sorriso é branco e grande e lindo, nesse momento eu acho o seu sorriso a coisa mais bela que já vi.
Com a mão disponível você toca meus cabelos, vai fazendo cafuné. Agora você vai chegando mais perto e eu já sei o que vai fazer. Antes de você chegar a minha orelha eu já estou de olhos fechados. É que você me conhece bem, sabe o que eu não resisto e adora me provocar. Eu pouso a cabeça no seu ombro e, ainda de olhos fechados, fico tentando respirar todo o seu perfume. Você continua com o cafuné, desse jeito vou acabar dormindo.
Levanto a cabeça e te lanço um olhar certeiro, você franze a testa, pois está imaginando que eu quero te falar algo. Mas não adianta você dizer “diga”, porque eu não vou. Se eu te explicasse você tampouco entenderia. Eu poderia começar pelo seu sorriso e compará-lo ao Sol, mas eu não consigo olhar muito tempo para o Sol enquanto que o seu sorriso eu poderia fitar por horas a fio. E, é claro, tem o seu cheiro. Único, seu, mas me passa uma sensação que lembra a minha infância, quando minha mãe tirava o bolo de chocolate do forno e me dizia que ainda não podia comê-lo, eu ficava ali respirando fundo até ficar meio extasiada, não aguentar de vontade e, então, roubar um pedaço. E por que eu só sei falar por metáforas?, eu não sei, mas você deveria me beijar logo.
Você me beija, eu te beijo. Nossos lábios colados bailam em transe os movimentos decorados desde a primeira dança. Já não é como antes, agora temos um beijo uno, nosso. E desculpe esse meu jeito extrapolado de ser quando eu te beijo, te olho ou te aperto. Mas a culpa é sua. Eu te aperto muito quando nos beijamos, sabe, porque às vezes penso que você pode desaparecer a qualquer momento. Mas não quero pensar nisso não, melhor é deixar meus dedos fluírem pelos seus cabelos e dar uma mordidinha no seu lábio inferior. Não vou abrir os olhos.
Hum. Ora devo lhe dizer que é mesmo uma pena que esse momento tão particular nunca tenha existido. E mesmo na sua inconsistência de não realidade ou de sonho ou mesmo de um passado distante, eu o vejo se extinguir junto ao sol no horizonte. O que invento e o que trago na memória há tanto tempo se misturam que já não sei de mais nada. As minhas verdades são tão frágeis...



[meu: 01/09/2009]

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

E o que é a morte diga lá meu irmão

(totalmente reescrito!)A gente recicla e reaproveita ideias, por que não histórias?

Amanheceu e nasceu o Sol. Um belo dia. Mas morreu. Mesmo com toda a vida, com todo aquele Sol lá fora. Digamos que o amor de todo o mundo e as suas bochechas rosadas de tanta saúde não detiveram o fatídico acontecimento. Morreu. Um rapaz que tudo tivera: família, amigos, dinheiro, garotas. Satisfeito consigo mesmo, com as relações que mantinha. Era boa a vida. Boa, até que um dia, um dia acordou morto.
Por um momento não conseguia orientar-se, parecia ter caído da cama em meio a um pesadelo. Já não tinha sono, estava alerta, olhos abertos, atentos a nova configuração. Sentou-se na cama. Não entendia o que sentia. Calçou os chinelos. Levantou-se. Estava tudo diferente agora, ele sabia. Tomou seu café. Escovava seus dentes enquanto olhava atentamente o espelho com um novo semblante alienado. Resguardava-se no interior da sua rotina, com certeza mais fácil do que encarar o incidente.
Saiu. Talvez pudesse ludibriar a angústia com a distração. Andou por lugares que lhe eram comuns, a rua de casa e a do trabalho, agora lugares estranhos, lhe diziam algo e ele tentava captar. Descobria um novo continente __ habitado por ruas escuras e olhos tristes. Sombras que não se escondiam, desfilavam desafiadoras e, eventualmente, esbarravam nele. O dia caminhava com aparente naturalidade, só ele ia contra a maré. Não, aquele não era seu lugar, não se encaixava. Que mundo era aquele que ia existindo... tão sem propósito e fora dele, como se ele nunca o tivesse visto. Ele viveu morto o dia como vivo, morrendo mais a cada instante. Estava imerso em um tédio, sem vida, sem cor. Não queria encarar a verdade que o encarava. E morria um pouco mais, enquanto se perguntava se lhe era possível falecer após tamanho infortúnio.
É que não esperava que morrer fosse assim, sem flores nem luto. Mas o que sabia ele sobre a morte, o bom-vivã. Um leviano, malandro e boa-praça, isso é o que ele era. Mas e o que ele seria a partir de então, posto que já não poderia ser o que fora um dia? O que faz alguém que amanhece finado sem saber se lhe roubaram todas suas certezas e crenças ou se elas jamais existiram? Como quem nasce. Como quem nasce. O que faz alguém que não sabe o que fazer de si? Aprende?, mas não esse homem. Se ele refletisse um momento veria que nada mudou tanto de lugar, afinal, ele nunca soubera muito que fazer da vida. Renascia em um corpo de adulto. Corpo duro e gelado e pálido. Para que todos aqueles exercícios?
No trabalho ninguém parecia lhe notar a morte. Passou por lá como um fantasma, talvez só tenha chegado até a porta e pressentira que aquele não era mais o seu lugar. Um enjeitado. Aberração. Ele foi para casa e estava exausto.
Em casa um desconforto fortuito. Entre aquelas paredes onde nenhuma alma estava viva, ele sentia-se sufocado por uma multidão. Melhor estivera nas ruas, quando vagava e as sombras esbarravam nele, mas nem lhe olhavam na cara. É que ele também tinha seus próprios fantasmas e, ao encontrar-lhe sozinho e indefeso, estes decidiram lhe afrontar a queima-roupa. Nem sinal de sombras nos seus espectro nítido. Que lhe deixassem sozinho afinal! Ah esses malditos olhos mortos que hoje deram para enxergar. Arrancaria de si os fantasmas, arrancaria tudo o que viesse pela frente. Onde estava Deus para lhe dizer seus pecados e mandá-lo ao purgatório?
Sensação de perda, perda de si, de significados. Vinha de dentro dele. Queria respirar e sentia falta do ar que estava ali, mas não satisfazia seus pulmões. Tremia, delirava. E como para embalar sua morte, teimava em andar pelos cômodos, com se fosse encontrar algo ali. Resmungava pelos cantos sobre sua condição, o que seria de si e de seus compromissos? Que droga era essa que estava acontecendo com ele... e se teria fim e blá blá blá. Eram devaneios febris. Ou simplesmente palavras que em vão tentavam descrever o substantivo.
Até que este homem que cismava com a morte sorriu. E aquele sorriso não era mais seu, era do outro que ele não conhecia, mas ia experimentando. Verdade que não sentia nada. Nunca estivera tão vazio, ele que tinha tantas coisas, tivera. E no escuro o que ele tinha era aquele sorriso, aquela careta bonita. Verdade que na morte não se leva nada. Mas também não se perde não. Brincava de experimentar, pois que tudo era novo e não havia escolha.
Ainda respirava com dificuldade, e sentia frio. Sintomas de morte. Era morte sem dúvidas. Toda aquela inquietação do dia agora pesava em seu peito. De muitas coisas não entendia. Nunca pensara muito na vida, mas vivia e isso sempre fora suficiente. Não era culpado. Por que pensaria na morte afinal! Raios! Não estava preparado para morrer, não para perder tudo assim. Não estava triste. Tristeza nada tinha a ver com isso. Era outro estranhamento, e vinha de lá, da perda, buraco em si mesmo, um grande buraco para preenchê-lo depois do que foi expulso. Foi um ato pensado, necessário, não sentia mais como antes a vida, e tudo o que ela significava. Estava vazio e sozinho. Tinha um grande corte no peito. Mas ninguém vinha. Nada. E não havia o que esperar. Que agonia tamanha era degustar o desconhecido; nada dependia mais dele.
O turbilhão de sua mente o inquietava. Sua esperança primeira: a paz da morte, ela deveria chegar a qualquer instante. E pedia a Deus que não lhe concedendo misericórdia ao menos lhe propusesse concordata.
Lá fora Sol se pondo, o dia de sua morte ia morrendo também. O Sol mandava raios, mas ele só filtrava brisas agora. Vinha essa brisa, diferente de tudo o que já sentira. Arrepiou-se todo, perdendo até o sorriso "seu". A atmosfera ficava cada vez mais mórbida, e de seu vazio interior algo novo passava a existir, que não lhe agradava. Ele nunca teve medo de nada, até então. De que? Odiava a metafísica e as questões políticas. Ele não tinha culpa se preferia a simplicidade. Mas parecia que estava em seu próprio funeral, sozinho, velando o próprio corpo, e isso ele não poderia ignorar.
A brisa sussurrava ao pé de seu ouvido, “que vá morrer, que vá temer”
Ele quase achou graça. Alucinações? Deveria ser o último dos sintomas, certamente. E, no entanto, aquelas palavras dentro dele percorrendo agitadas, e quanto mais as repetia mais elas eram convincentes.
Contudo nada de grand finalle. Ele permanecia morto-vivo.
Depois que o tremor passou, ele pode pensar melhor. Sua mente desanuviava, ele enxergava dentro de si. Qual era a grande resposta que se aproximava? Nunca fora filósofo, mas tentava ser racional. Pensou sobre a morte, tudo o que estava passando e a grande perda. Perder a vida era triste. Entendeu. A morte era triste e ele se se permitia a tristeza. Mas havia um motivo maior que explicasse tudo? Ele pensou durante horas. A vida e a morte, um mistério.
Voltar a gozar plenamente o seu viver, a partir desse momento se tornara impossível. Parte dele era morte e não havia início nem fim, parte imersa no todo.
Ele buscava respostas, “de que adianta viver morrer?”, todos continuam a encenação. Estava inseguro. Sentia responsabilidade sobre a vida. A voz havia sido clara, estava só e deveria ter medo. Tudo era tão mais complicado do que imaginara. Como não fora capaz de perceber! Como ignorara por tanto tempo o medo? Medo e vida. Tudo está ligado, caberia a ele encontrar o equilíbrio.
Realmente, a vida não era tão boa assim, ele refletia. Achava muita injustiça em viver. Morrer não, morrer era justo, igual para todos. A presença da morte que me tornou mais cauteloso, obrigado a valorizar a vida.
Percebia-se, mudava.
Deveria rezar? Talvez ainda lembrasse o Pai nosso. Achava que poderia ter feito muitas coisas diferentes. Mas era tarde demais. Tudo claro agora. Ele fora tão tonto, como pudera viver feliz, despreocupado, alienado do fato de que se pode morrer a qualquer momento. O peso da morte o envelhecia, rugas em um rosto jovem. Nem mais uma gota de felicidade, de vida. A culpa selava sua morte.
A culpa o atormentava. Pensava que, talvez, se tivesse me preocupado mais, refletido mais antes de agir. Bem, deveria ter se preocupado com a morte ao invés de viver só de alegrias frívolas. Se tivesse sido mais sério.
Morreu o dia e anoiteceu. A brisa da noite era diferente. Não oprimia, era mais leve. Um frescor de vida veio soprar em seu rosto. Era a vida que ainda estava ali, o chamava para uma ainda, quem sabe possível, felicidade?
Criava conjecturas. Para ele, tudo perto dela era pequeno __ encontrava a beleza da morte. Mais alguns problemas lhe surgiam, somente alguns bem pessoais. Ele e suas partes refletiam acerca da essência humana, o que significava existir e se realmente tivera o que chamamos de identidade. Ele buscava seu próprio equilíbrio.
Que ironia era acordar para a vida na fatídica hora da morte. Mas ele estava mais forte! Sim, a morte o fortalecera. Era um homem afinal, pronto para viver ou morrer. E como homem que era sentia medo, arrependimento. Conhecia a vida e a morte. A vida vinha pela janela abstratamente. Mas ele congelado, que podia fazer? O frescor da vida, em contato com sua pele morta, feria. Era uma dor que não doía, mas desesperava; dor invisível de quem só espera pelo fim, ou pelo começo.
Olhou para dentro de si, e seus olhos de repente brilhavam de emoção. Ali a sua frente estava a grande descoberta. Talvez pudesse tocá-la! E tentava, pois que estava dentro da morte, __ “morte que redime nossos erros, clareia nossas dúvidas. Então, não são inimigas a morte e a vida! Duas forças diferentes que se completam... aí está o equilíbrio!” E sentiu-se cheio, redondo. Como não havia percebido antes? Sentia-se bem na morte, enxergava o escuro com seus novos olhos. Que sensação mais pueril, a quase tranquilidade e, no entanto, sua boca aguava da vontade de comer aquele instante, devorá-lo para si que era seu, para que ele sempre fosse seu. Ali não via o óbvio, via além; e todo ele se alimentava avidamente daquela náusea doce. “Ah, quero viver!”.
Queria viver! Sim, compreendia que amanhecer em morte o fez acordar para si. Que vida era leviandade e tudo o que trazia era prazer, enquanto a morte secava toda a ingenuidade, o tornava perspicaz, um tanto desconfiado. Descobrira que às vezes era preciso buscar força na morte para se entender a vida.
Pressentia que logo despertaria para seu novo caminho. E agora ele sabia que tudo seria diferente, nem vida nem morte; o que era isso então? Conformado, “A morte está em mim, ela precisa existir para que exista vida. Vida, Morte e uma linha que sou eu, essa é toda a verdade que conheço”, ele entregou seu último suspiro, e neste não havia bondade.
Às sete da manha, o despertador toca, como de costume. Um calafrio percorreu sua coluna vertebral, abriu os olhos. Verdade que fora um longo e estranho sonho, e ainda assim somente um sonho. E tudo estava lá nele, aquela verdade do sonho, poderia sentir a verdade boiando em sua garganta, sutilmente lhe asfixiando. Uma pergunta o inquietava: será que o que o sonho desencadeara caberia nos seus dias? Ela alojada palpitava, reclamava valor e era grande. Em seu instinto hostil de bicho livre, a cativa Verdade encurralando seu dono, desafiadora. O cativo dono inóspito, cheio da ambição e vivo. Os mortos sabem muito mais do que os vivos, pensou e calmamente ele levantou-se e resoluto, refletiu se deveria engoli-la ou vomitá-la.
Havia de pesar as duas opções, cometera um erro: sempre há escolhas. Decidiu-se então por vomitá-la, posto que ainda tinha medo de fantasmas. E o que é a vida senão uma grande ilusão.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Lucas

Reescrito dia 23/02/2010.

LUCAS.


Novamente aquele olhar. Aquela expressão de devoção e dor; como se eu fosse uma espécie de entidade religiosa que devesse ter compaixão. O que eu sentia era pena e, talvez, um pouco de raiva também. Em troca, dei a melhor expressão sarcástica que pude. “Seja homem. Choramingar não levará a nada, nem me fará ser mais seu.”
Num estalo, ele recuperou a compostura e encarou-me. Eu sabia que ele já estava exausto para continuar, e que mesmo assim eu não poderia deixá-lo em paz.
“Tão injusto, você nunca foi e duvido que um dia será meu,” ele insistiu em um tom ressentido.
“Hum,” sorri um tanto admirado. Ele tinha toda a razão. Não que eu não me importasse, aqueles olhos ora abatidos e ora esperançosos eram o que me fazia existir. Mas eu não podia evitar sentir-me o possuidor, e o era de fato. Como uma mãe e seu filho, ou melhor, como um homem e seu cão. Um homem que, seguro de sua posição de senhor da casa, cria um cão no quintal, alimenta-o, lhe oferece algum tempo de seu dia, passa a estimar o animal. Um cão sempre deve ser submisso ao seu dono.
“Cego é aquele que não se descobrir nessa vida,” disse ao acaso, enquanto apreciava seu quarto. Tão bobo com todos aqueles livros e discos românticos. Preso em seu próprio conto de fadas, o meu querido cão, sempre fantasiando as coisas que não existem.
Ele ainda me avaliava. “Não me amas?” e era mais uma exigência que pergunta. Perscrutei seu olhar. Dessa vez nem esperança nem melancolia, sua fisionomia exprimiu um sentimento que não reconheci.
“Eu não sei...” respondi, duvidando de minhas próprias palavras. Queria ser sincero para ele. “Mas acho que sim,” e foi o mais perto de franqueza que jamais lhe entreguei.
Ele suspirou, “Lucas, hoje não me apetece enternecer-me de suas mentiras,” dessa vez ele parecia decidido. Mas será mesmo? Resolvi provocar-lhe. “Não procure em mim suas certezas. Por favor, perceba de uma vez por todas que não irá encontrar nenhuma aqui.” Então acho que consegui atingi-lo, ele desviou o olhar e levantou-se. Afastava-se, me dando as costas. Senti uma inquietação subir-me pela espinha.
“Você é um homem, então. Sim você é. Um homem muito metido a besta,” falei assim, atacando-lhe as palavras, queria que ele olhasse para mim. Ele olhava a janela.
“É muito feio esse seu jeito de nunca saber decidir-se,” afirmou. A aspereza de sua voz me atingiu com tanta força que me paralisou por completo, não consegui articular uma só palavra. Há quanto tempo eu não ouvia sua voz assim, não lamuriosa, determinado.
Mais uma vez, ele com a razão. Não gostava de me sentir acuado com suas perguntas e, no entanto, sempre achava um meio de me divertir com elas. Era bom reverter as situações só para deixá-lo irritado. E eis que agora eu, eu não sabia o que poderia dizer a ele, que parecia tão absorto em seus pensamentos e, como sempre, olhava a lua. Colocou um CD, a faixa de sempre, Sixpence tocava “Kiss me”.
“Você sabe bem. Você olha a Lua, você só deseja o inalcançável. Venha, tente, kiss me,” eu sabia que o veneno boiava quente em minhas palavras. Logo ele iria se virar, os olhos rasos d’água, e pedir que eu parasse com tudo aquilo.
Mas ainda fitava a Lua, estaria hipnotizado? Talvez eu tenha sido muito cruel, estaria em choque? Queria ver-lhe a face. Tentei dominar o pânico que crescia involuntariamente a cada segundo que ele rejeitava a minha presença ali. Vejo que será uma noite longa e inédita.
Começou a balbuciar umas palavras. Não era para mim que ele falava.
“tentar tocá-la, poderia, mas estás tão, tão longe. Oh Lua, minha dama misteriosa, me contarias se eu estivesse totalmente errado, não é? Por favor, me diga se perfeição, se completude só é possível nos sonhos ou, ou se posso continuar sonhando aqui. Eu não entendo, não consigo juntar os pedaços de mim.”
Terminei minha prece e virei; meus olhos piscaram ao ver o estranho no espelho. “Não sei quem você é, então,” Eu confrontei Lucas pela primeira vez.
Um lapso de surpresa, ou terá sido medo. Lucas agora franzia a testa, desconfiado. “Qual é a questão agora? O que eu perdi, meu querido?”
“Eu sempre te dei poder sobre mim,” disse em um rosnado entre meus dentes, era como se uma fera tentasse se libertar através da minha boca.
“E isso é errado? Reflita, meu caro, se não é a ordem natural das coisas. Há sempre um vencedor,” Lucas ria-se de mim tentando parecer à vontade, mas sua voz não parecia firme como de costume.
“Lucas, Lucas, sempre tão o inverso de mim. Você sempre diz o que pensa, não?” dessa vez ele não iria me dominar o espírito. Não iria deixá-lo me enlouquecer.
Olhei fixamente o seu belo reflexo. Analisei aquele que era o motriz de minhas oníricas aspirações. Meu corpo automaticamente congelou quando seus olhos trancaram os meus. Tão intensos eram os olhos de Lucas, sempre me dragavam para dentro dele. Eu sabia que não poderia escapar.
“Você escolheu a imaturidade para lidar com os jogos de viver, não é?” eu não queria me entregar sem lutar, eu precisava entender.
“Eu vejo a vida como um contínuo vir a ser. Não espere nada de mim.”
“Mas diga-me, eu te imploro, como pode ver tanta graça em errar?”
“Eu não sei,” Lucas murmurou. E pela primeira vez estava ali e, como ele pode me deixar vê-los! Lucas nunca demonstrava suas fraquezas, mas a minha frente estava um par de olhos tristes. Nem sinal do sorriso irônico que eu tanto amava. Vê-lo sentir dor me ensandecia.
“Kiss me, Lucas,” minha voz estava bem alta agora, desesperada, “por favor, por favor, seja meu, complete-me.”
Eu desprendi meu olhar dos seus e mirei os meus dedos dos pés. Tentei me focar nessa imagem, enquanto me esforçava para afastar o pensamento de Lucas saboreando minha fraqueza com seu ar de satisfação. Mas talvez não. Nunca vi Lucas sofrendo, nem mesmo um ponto fraco. Ele sempre escondia seus sentimentos por trás daquelas piadinhas afiadas e sempre prontas para implicar ou me entristecer. Assim era Lucas. Eu não me importava, eu não podia evitar amá-lo de qualquer forma. No entanto, uma pequena parte de mim acreditava que Lucas me amava e, sendo assim, ele estaria tão triste quanto eu estava. Mas era uma parte tão diminuta que não se atrevia a lhe dirigir a palavra. Eu esperei pelo seu veredicto. Não veio. Então me preparei para encará-lo, não havia nada a perder.
Embora preparado, ver sua face perfeita em dor me fez perder o fôlego; seu reflexo era um eco do meu agora. Examinei o ângulo tenso de suas sobrancelhas; um instante eterno. Então compreendi. Ele sempre tentou me dizer, estava em seus gestos, seu sorrir, mas eu fingiria não ouvir, não ver. Eu não podia ser culpado, eu adorava Lucas! Amá-lo fora minha vida durante tanto tempo. Eu não me importava em ignorar o que estava exatamente a minha frente. Faria qualquer sacrifício de bom grado por ele, mas já estava terminado desde o começo. Lucas era algo que eu nunca poderia ter e o que eu mais desejava. Todo o tempo ele tentava apenas me fortalecer, mas eu falhei novamente.
“Está tudo bem, Lucas. Eu entendo agora,” fraquejei, minha voz tão frágil quanto uma porcelana. Eu lutava para que minha mente não depreendesse as palavras que eu tinha, mas relutava desesperadamente por não ter que dizer.
"Eu quero que você saiba que eu, finalmente, vejo a verdade e," não pude terminar a frase, não podia. A dor era dilacerante e entorpecia meu corpo, meus lábios seriam o meu implacável carrasco. "Você pode ir, Lucas. Você não está mais ligado a mim," disse, mas não foi mais que um sussurro.
Eu estava em pedaços. Com os olhos fechados, percebi que estava tremendo, abafando um grito excruciante. Lucas era o centro do meu universo, mas não podíamos ficar juntos. Lucas era perfeição, intangível fora daquelas paredes. Era inevitável, um dia eu teria que encarar a realidade e deixá-lo ir, pois eu sabia que nós não pertencíamos ao mesmo mundo. Eu poderia resistir àquela dor desde que ele estivesse a salvo da minha obsessão.
Minhas certezas submergiram na escuridão do meu futuro. Minha vida seria um vazio negro dali em diante, eu sentia como se já o fosse. Não pude evitar sangrar por dentro. Escutei ele chamar meu nome, sua voz tremendo também, fez-me arrepiar.
“Eu te amo.”
Inesperado. Não, ele já devia estar longe e agora o entorpecimento me causava alucinações. Meus olhos estavam embaçados e úmidos. Levei alguns segundos para me restabelecer. Ele pegou minha mão. Ali estava a sua bela imagem, ah, Lucas estava brilhando. E me estendia a mão, confiante.
“Lucas. Não há como. Lucas, o que eu posso fazer?”
“Vem comigo?”
As palavras não faziam sentido, mas soavam como música. Lucas me queria. Ele me preencheria, era tudo que eu sempre quis. Nada mais impediria que eu vivesse a história que inventei. Afinal, minha alma já era dele desde o princípio.
Eu lhe ofereci meu sorriso tímido. Ele sorriu de volta, aquele seu, meu, lindo sorriso torto para o canto, que de tão grande e brilhante não poderia ser real. Oh, Lucas era um anjo! Meu Lucas. Ele sabia que eu iria com ele para onde quer que fosse, faria tudo por ele.
É servir a quem vence o vencedor. “Para sempre.”
E os dois se foram no sumidouro do espelho. Eles se permitiram, enfim.

sábado, 11 de julho de 2009

Carta à alma que deixei

Sábado, 11 de julho de 2009.

Alma minha que despedacei,

O meu esquecimento de ti foi só momentâneo, volto para te dizer que ainda não sei a que vim. Eu amante dos excessos, que não me contenho por extravasar, emburrei a cismar que tanta liberdade me trazia vazios de alma. Precisei voltar a ti, e trago-lhe uma proposta de equilíbrio. Que o nosso conflito seja substituído pelo contraponto sem bases lógicas, para que fiquemos ambas loucas, loucas de amor. Hoje vejo que não foi você que me faltou, eu faltei a mim mesma.
Procurar estima nos olhos do outro exige que se esteja sempre apresentável. Preço alto da eterna vigilância. E eu que sou tola por consequência do existir, escolhi não vigiar, escolhi agradar-me. Entre o orgulho por tamanha audácia e a certeza da escolha errada me perdi. No meu mundo sem fé, só queria me desconectar de ti. E nunca, nem por um momento senti a felicidade ou a tristeza, senti o perigo e então tive certeza de estar viva. Voltei sem arrependimentos para me redimir.
Permita a minha inutilidade para expectativas? Eu não presto! Não conheço um só caminho capaz de me manter inteira, procuro, acho bifurcações. O que quis, o que fiz, o que pensei, nada nunca fez sentido. Desci ao inferno para dissacralizar os dogmas. Não consegui! Engana-se se pensa que sou obcecada pela verdade, pois eu minha cara, não desvendo nem os ventos. É que me completo nas dúvidas, sou as palavras de Castro Alves: “o porvir em frente do passado”. E sendo assim nunca fui nada mais que uma vírgula. E é isso que lhe tenho a oferecer. E peço para que volte, que aqui em mim até as pedras mudas choram de saudade.
Me redefine! O que me conta de novo? Não vejo a hora de estar contigo e juntas novamente transporemos todos os limites que quisermos. Sem você sou incapaz de ler o mundo, incapaz de amar, mesmo que seja amor do meu jeito.


Com amor amor, seu corpo.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Cindy’s fairytale



Am I scaring you with my incoherent fingers? When they try to touch you and you turn into a ghost, do they feel like fire? ‘Cause that’s it, I want to burn you. You don’t understand now but these idle fingers of mine are the proof of solitude. Their numb state of nonsensical meaning make me unable to see my fingerprints. So where is my identity? I should go.

Once upon a time they told me there was no path for a banned princess. I do not live a fairytale. There was that dream, it lived inside my nerves and became tough, like ice. I knew that ice is breakable like kings are deposed. Then I put my hair over my face, my face drowning, didn’t know where I was going. I warned the kingdom: “Cindy will look for her soul”. She has walked half way by now.

She is tired; she was born a frog girl. Her animal instinct made her survive. It would always send her hope enough, the smallest amount of hope a being needs to live for. She waited for the best thing that always comes, to come for her. A well respected man met her gaze, but he avoided her, she was dirty somehow. He shivered when he saw the thing. The thing her heart was hiding. She was hiding from the world, because she wanted to be the world’s best friend. Then she went on, defeated by all the luck her friend had given her. It seemed like a hopeless princess on a hopeless street. But it was not. They worshiped her by fear, she existed although she shouldn’t.

Dark nights came, when either moon or Cindy would exist for no reason. Waiting for the next best thing, everyday waiting. Life is sweet for Cinderella and for the dragon as well. For the people who read it is not. But I must mention that I owe the dragon my strength. On foot, naked soul walked in no direction. Each day lying to herself, waiting and feeling that nothing would come. The dissimulate Cindy started to hope for nothing, willing for no thing to come. Truth never hurts people who have a precious bleak heart like hers.

In a village, state of nowhere, she was arriving. Maybe the peace was getting closer, enough to touch? Enough to slap me? It is just a ghost that I can never reach. But I see it, it is real. The numbness of her fingers overtakes her body. She falls asleep. In her dreams sleeping Cindy feels deceived because they took her conscious. Eventually she has gone carrying empty pockets, nothing is worth such a walk. Perhaps she has found peace, here there is nothing else to be done.

I linger, I stay awake.

sábado, 2 de maio de 2009

Um ponto de vista

Doces e vulneráveis seres humanos. Fadados, acorrentados a almas, nos mandam vir e assim nascemos. Este é um ponto de vista. O direito de morrer tal qual o direito de nascer há de ser a única certeza que podemos ter a audácia de carregar. Racionalmente é claro, pois sei que há certas certezas que nos são tão vitais que às vezes as confundimos com a lucidez. E todo o ser tem o direito de acreditar em sua certeza, por mais inventada e estapafúrdia que lhe pareça, é todo nosso, um direito declarado.

Resguardo-me então, o direito de não ter certezas. O direito de duvidar, de pôr em xeque, desconfiar. Lanço meu olhar furtivo para a eternidade. Dispenso os fatos, exploro a substância.

Parece-me extremamente injusto o fato de ser eterno. Qualquer que seja, Deus ou Edward (admito, a comparação é esdrúxula), nada deve ser eterno, tudo tem o direito de morrer em sua forma, mudar, se repensar, assim como eu, que da humanidade herdei a mortabilidade. Pequena e mesquinha, invejo o cânone, os símbolos, tradições, certezas, aliás. O papel desagradável de trazer a minha superfície pérfida a demolição de tudo o que é palpável aos meus olhos corrompidos. O papel de perfilar o ciclo vicioso em que me enterro quando escrevo. Só quando escrevo. É como psicografar, e ter a alma perdida em um vale de lágrimas.



Aqui está a dor da destruição e culpo somente a eternidade alheia. Mas o que mais eu poderia querer ser, se para sempre terei a identidade diluída, a felicidade de poder ser banal e até ridícula. Não me tome por cética, não há nada em que eu não acredite categoricamente, e vice-versa. Desconfio do amor eterno, do deus eterno, da dor eterna. Tudo tem o direito de existir, tudo tem o dever de passar. Mutabilidade é vida.

terça-feira, 28 de abril de 2009

Devaneios


Olho para o ponto fixo em minha memória
Quantos invernos mais ficarei aqui?
Vejo duas estrelas cadentes
Brilham, prometem, apagam-se
Olhos de chama frívola
Fonte que me bebe sem piedade.
Peço, clamo por devaneios mais sãos
Prometes, não cumpres
Não há culpados, só o brilho e o frio
O fogo já não arde
Só cinzas e uma fagulha eterna.


Fernanda Dávila [meu heterônimo rsrs]

15/08/08

terça-feira, 21 de abril de 2009

O dogma

Pode ser que eu fuja da eternidade
Pode ser que eu tenha medo.
Que a luz lá de fora,
a luz que me cega, seja a morte.
Mão não é. Não é a morte é a dor.
É covardia.

Há um olhar descrente que poetiza,
na mais alta montanha de mim.
Um sorriso irônico que se ri convulsivamente.
Ri das flores de mim.

Eu tenho braços curtos, mãos pequenas.
Sou fraca e inútil.
A eternidade não mora em mim.
Pudera eu ter forças para cativá-la.
Pudera eu ter fé.

[poesia; Thamiris Oliveira de Araujo, 20 de abril de 2009]

terça-feira, 24 de março de 2009

Acordando para a morte

(Este conto foi totalmente rescreito. Conta afora com o título de: "E o que é a morte diga lá meu irmão". E está em uma postagem do mês de agosto.)

O menino tinha tudo. Ria com amigos, muitos ao seu redor. Eram festas, era tanta diversão! Sempre havia pessoas bem solícitas, bem interessadas. Tinha dinheiro também, viajava com a família esporadicamente; e nada lhe faltava, nunca. Era boa a vida. Boa, até que um dia... Um dia acordou morto.
Amanheceu e nasceu o Sol. Um belo dia. Mas morreu! Mesmo com toda a vida, com todo aquele Sol lá fora, mesmo com todo o amor de todo o mundo. Morreu.
Por um momento não conseguia orientar-se, parecia ter caído da cama em meio a um pesadelo. Já não tinha sono, estava alerta, olhos abertos e atentos a nova configuração. Sentou-se na cama. Não entendia o que sentia. Calçou os chinelos. Levantou-se. Era tudo diferente agora, ele sabia. Tomou seu café. Escovava seus dentes enquanto olhava atentamente o espelho com um novo semblante alienado. O que será que ele via ali?
Saiu. Andou por lugares que lhe eram comuns, a rua de casa e a escola, agora lugares estranhos, lhe diziam algo e ele tentava captar. Descobria um novo continente __ habitado por ruas escuras e olhos triste. Sombras que não se escondiam, desfilavam desafiadoras e eventualmente, esbarravam nele. O dia caminhava com aparente naturalidade, só ele ia contra a maré. Não, aquele não era seu lugar, não se encaixava. Que mundo era aquele que ia existindo... tão sem propósito. Ele viveu morto o dia como vivo, morrendo mais a cada instante. Estava imerso em um tédio, sem vida, sem cor. Não queria encarar a verdade que o encarava. E morria um pouco mais, enquanto se perguntava se era possível morrer depois de morto.
“Então é isso, morri.”, dizia angustiado, “Tantos passam por mim, mas parece que não me enxergam. Mas como se estou aqui tão morto! Ou será que não se importam?”
Não esperava que morrer fosse assim, sem flores nem luto. Na verdade, sua vida até então era tão “vida”, digamos vívida, amena. Ele não sabia muito sobre a morte, só vagamente. Como quem que por ignorar despreza, tudo simples, automaticamente. Era culpado por isso? Deveria ter levado a morte mais a sério e agora estava sendo castigado?
Ele foi para casa. Estava tão exausto. Lá encontrou a família e também ninguém que lhe notasse a morte. Todos faziam algo, tão envolvidos em suas rotinas diárias, pois eles tinham uma vida. Ele ficou nervoso, se emburrou, foi para o quarto. Tirou os sapatos com muita raiva, jogou-os longe, um em cada canto. Onde estava Deus para lhe dizer seus pecados e mandá-lo ao purgatório? Onde estava a luz para que ele a seguisse?
Fechou os olhos, tudo tão escuro. E assim de olhos fechados foi se acalmando. Foi expulsando de seu pensamento tudo que o irritava, a rotina, a escola, os amigos e a família. Tudo expulso. Dentro dele agora nada havia de valor.
Sensação de perda, perda de si, de tudo. Vinha de dentro dele. Queria respirar e sentia falta do ar que estava ali, mas não satisfazia seus pulmões. Tremia, delirava. E como para embalar sua morte, dizia sem emitir som: “Eu sinto a morte, sim. A morte está em mim, não há como negá-la. Eu a sinto em cada músculo de meu corpo. Estou morto, nada importa mais, não tenho medo. Não sinto nada. Morto”. Eram devaneios febris. Ou simplesmente palavras que em vão tentavam descrever o substantivo. Mas ele estava no escuro.
O menino cisma na morte e sorri. E aquele sorriso não era seu, era do outro que ele não conhecia, mas ia experimentando. Verdade que não sentia nada. Nunca estivera tão vazio, ele que tinha tantas coisas, tivera. E no escuro o que ele tinha era aquele sorriso, aquela careta bonita. Verdade que na morte não se leva nada. Mas também não se perde não. Brincava de experimentar, pois que tudo era novo para ele.
Ainda respirava com dificuldade, frieza, palidez. Sintomas de morte. Era morte sem dúvidas. Toda aquela dormência do dia agora pesava em seu peito. Eram tantas coisas que não entendia. Nunca pensara muito na vida, mas vivia e achava a vida boa. Não era culpado disso, não é? Por que pensaria na morte afinal! Raios! Não estivera preparado para morrer, não para perder tudo assim. Não estava triste. Tristeza nada tinha a ver com isso. Era outro estranhamento, e vinha de lá, da perda, buraco em si mesmo, um grande mesmo que ficou depois que tudo foi expulso. Foi um ato pensado, necessário, não sentia mais como antes a vida, e tudo o que ela significava. Estava vazio e sozinho. Tinha um grande corte no peito. Mas ninguém vinha. Nada. E não havia o que esperar. Que agonia tamanha era morrer e experimentar; nada dependia mais dele.
A confusão de sua mente o inquietava. Precisava encontrar a paz da morte.
Lá fora Sol se pondo, o dia de sua morte ia morrendo também. O Sol mandava raios, mas ele só filtrava brisas agora. Vinha essa brisa, diferente de tudo o que já sentira. Arrepiou-se todo o menino, perdendo até o sorriso "seu". A atmosfera ficava cada vez mais mórbida, e de seu vazio interior nascia algo, que não lhe agradava. Ele nunca teve medo de nada, até então. De que? Ah que era tudo tão simples... Ele não tinha culpa disso também. Mas parecia que estava em seu próprio funeral, sozinho, velando o próprio corpo.
A brisa sussurrava ao pé de seu ouvido, “Menino tolo. Está morrendo não? Tem medo? Deve ter medo.”, e voz repetia, “Você morre hoje, tenha medo”.
Ele quase achou graça. Alucinações? Deveria ser o último dos sintomas, certamente. E, no entanto, aquelas palavras dentro dele percorrendo agitadas, e quanto mais as repetia mais elas eram convincentes.
Contudo nada de grand finalle. Ele permanecia morto-vivo.
Depois que o tremor passou, ele pode pensar melhor. Sua mente se anuviava, ele enxergava dentro de si. Qual era a grande resposta que se aproximava? Não, ele não era filósofo, mas tentava ser racional. Pensou sobre a morte, tudo o que estava passando e a grande perda. Perder a vida era triste. Entendeu. A morte era triste e ele se se permitia a tristeza. Mas havia um motivo maior que explicasse tudo? Ele pensou durante horas. A vida e a morte, um mistério.
Voltar a gozar plenamente o seu viver, a partir desse momento se tornara impossível. Parte dele era morte e não havia início nem fim, parte imersa no todo.
“De que adianta viver morrer?”, ele buscava resignado, “Aqui jaz meu corpo, e agora aqueles que amo continuam a encenação sem mim”.
Estava inseguro. Sentia responsabilidade sobre a vida. A voz havia sido clara, estava só e deveria ter medo. Tudo era tão mais complicado do que imaginara. Como não fora capaz de perceber! Como ignorara por tanto tempo o medo? Medo e vida. Tudo está ligado, caberia a ele encontrar o equilíbrio.
“Mas a vida, a vida não era tão boa assim”, ele refletia. Achava muita injustiça em viver. Morrer não, morrer era justo, igual para todos. “É a presença da morte que me torna mais cauteloso, obrigado a valorizar a vida”.
Percebia-se, mudava.
Deveria rezar? Ele não tinha religião. Ele queria era estar com sua família agora, queria. Achava que poderia ter feito muitas coisas diferentes. Mas era tarde demais. Tudo claro agora. Ele fora tão bobo, como pudera viver feliz, despreocupado, alienado do fato de que se pode morrer a qualquer momento. Porque as pessoas morrem. As pessoas morrem. E agora o peso da morte o envelhecia, rugas em seu rosto de menino. Nem mais uma gota de felicidade, de vida. A culpa selava sua morte.
A culpa o atormentava. Pensava que “talvez se tivesse me preocupado mais... refletido mais antes de agir”. Bem, deveria ter se preocupado com a morte ao invés de viver só de alegrias frívolas. Todo o sol e o mar e os vínculos e o cachorro e as coisas que ele amava, todas essas o haviam deixado. Ele deveria ter amado menos, não seria tão difícil se tivesse amado menos. Se tivesse sido mais sério.
Morreu o dia e anoiteceu. A brisa da noite era diferente. Não oprimia, era mais leve. Um frescor de vida veio soprar em seu rosto. Era a vida que ainda estava ali, o chamava para uma ainda, quem sabe possível, felicidade?
O menino era homem e cismava, criava conjecturas. Para ele, tudo perto dela era pequeno; encontrava a beleza da morte. Mais alguns problemas lhe surgiam, somente alguns bem pessoais. Ele e suas partes refletiam acerca da essência humana, o que significava existir e se realmente tivera o que chamamos de identidade. Ele buscava seu próprio equilíbrio.
Que ironia era acordar para a vida na fatídica hora da morte. Mas ele estava mais forte! Sim, a morte o fortalecera. Era um homem afinal, pronto para viver ou morrer. E como homem que era sentia medo, arrependimento. Conhecia a vida e a morte. A vida vinha pela janela abstratamente. Mas ele congelado, que podia fazer? O frescor da vida, em contato com sua pele morta, feria. Era uma dor que não doía, mas desesperava; dor invisível de quem só espera pelo fim, ou pelo começo.
Olhou para dentro de si, e seus olhos, de repente, brilhavam de emoção. Ali a sua frente estava a grande descoberta. Talvez pudesse tocá-la! E tentava, pois que estava dentro da morte, __ “morte que redime nossos erros, clareia nossas dúvidas. Então, não são inimigas a morte e a vida! Duas forças diferentes que se completam... aí está o equilíbrio!” E sentiu-se cheio, redondo. Como não havia percebido antes? Sentia-se bem na morte, enxergava o escuro com seus novos olhos. Que sensação mais pueril, a quase tranquilidade e, no entanto, sua boca aguava da vontade de comer aquele instante, devorá-lo para si que era seu, para que ele sempre fosse seu. Ali não via o óbvio, via além; e todo ele se alimentava avidamente daquela náusea doce. “Ah, quero viver!”.
Queria viver! Estava tão próximo da revelação de toda a verdade. Sim, compreendia que amanhecer em morte o fez acordar para si. Que vida era leviandade e tudo o que trazia era prazer, enquanto que a morte secava toda a ingenuidade, o tornava perspicaz, um tanto desconfiado. Descobrira que às vezes era preciso buscar força na morte para se entender a vida.
Pressentia que logo despertaria para seu novo caminho. E agora, ele sabia que tudo seria diferente, nem vida nem morte; o que era isso então? Conformado, “A morte está em mim, ela precisa existir para que exista vida. Vida, Morte e uma linha que sou eu, essa é toda a verdade que conheço”, ele entregou seu último suspiro, e neste não havia bondade.
Às sete da manha, sua mãe bateu na porta para lhe acordar, como de costume. Ele não a respondeu. Um calafrio percorreu sua coluna vertebral, abriu os olhos. Verdade que fora um longo e estranho sonho, e ainda assim somente um sonho. E tudo estava lá nele, aquela verdade do sonho, poderia sentir a verdade boiando em sua garganta, sutilmente lhe asfixiando. A perguntava o inquietava: será que o que o sonho desencadeara caberia nos seus dias? Ela alojada palpitava, reclamava valor e era grande. Em seu instinto hostil de bicho livre, a cativa Verdade encurralando seu dono, desafiadora. O cativo dono inóspito, cheio da ambição e vivo. E a garganta? A garganta pungia ansiosa e obediente, espreitando o seu tesouro, alerta, a espera do comando. Calmamente, ele levantou-se e resoluto, refletiu se deveria engoli-la ou vomitá-la.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Eles

Ela já se encontrava debilitada, trêmula muito pálida. Escrevia há milênios. Os olhos ardendo, o pulso pungindo. Ela escrevia sobre o coração.



Há muito tempo atrás Lia descobrira seu coração. Até então tudo era vida, mas a menina não se dava conta de nada, da infância vivia as inconstâncias. Não havia muito do que se falar da época antes dele aparecer. Não foi em nenhum evento ou data especial que ele veio, simplesmente apareceu. Não causou estranhamento não, foi bem natural. Simplesmente começou a existir nela, e era nas pequenas coisas da vida que ela o notava. Com o passar do tempo o seu modo de sentir mudou, agora ela realmente sentia! Logo, passou a estimá-lo, que bom que ele estava lá. O mundo não podia ser mais colorido agora que ela tinha um coração e se dava conta disso. Curiosa, a mocinha se entretia nele, que era o seu melhor amigo. Ele a encantava e, irremediavelmente, ela passava a vê-lo em tudo. Para a romântica e sonhadora Lia, ele era mágico, de artimanhas infindáveis. Um órgão inflamável e impermeável, capaz de tudo suportar.
Lia vivia tanto por seu coração que ficou egoísta, passou a se perguntar se todos o tinham. Ele era tão dela, não fazia sentido que todos possuíssem um. Ela era esperta, queria descobrir tudo a respeito da vida. Analisando o mundo, foi percebendo que nada era tão colorido se você pairasse seu olhar ali, por um tempo. “Era fato, com o tempo tudo desbotava”, constatou a moça. Era a sua descoberta. Se todas as outras pessoas tinham um coração ela não sabia, mas se tivessem... bem, se o tivessem eles com certeza não se davam conta disso, não como ela, pois só o seu coração sabia a verdade das cores. Orgulhosa dele, ela distraia-se em seus cuidados e mimos. E havia de ser boa para ele, tinha de ser. Pois se ela era jovem e tinha afeto. Dona dele, todo encantador e amuleto.
Muito tempo se passou, mas nela não havia muitas mudanças; era como se ela não as quisesse. Ela se percebia como uma cientista a procura de respostas e se voltava toda para seu trabalho. Só olhava para dentro de si, olhava para ele. Queria descobrir se tinha regras, modo de usar. E como quem disseca um corpo, ela o analisava. Estava obcecada por ele. Tudo era meticulosamente estudado, não podia dar um passo em falso, qualquer erro poderia ser fatal. Havia de controlar os batimentos, a pulsação, nenhum passo não programado, nada podia sair de seu controle.
Não se dava conta, mas a vida agora era só opacidade. Sua fixação já não tinha mais fim. Ele se confundia nela e não se sabia qual dos dois era o mais cinza. Foi exatamente nessa época que ele passou a doer. Ah isso certamente não estava nos planos! A dor veio da dormência e era tão profunda neles, era como perder um membro. Dor, Lia nunca havia experimentado qualquer aflição ou amargura. Ela planejara tudo muito bem e estava certa de que todas as suas funções vitais estavam em perfeita ordem. Não passava, se alastrava pelas suas veias como fogo. Era de enlouquecer. E assim surgiu o ódio. A culpa era toda dele, não havia dúvidas, ele era a fonte da dor. Logo ele, que andou tão manso por toda a vida, vinha agora matá-la. Sonso! Talvez só esperasse a hora certa para apunhalar. Ela não podia suportar mais, infidelidade dele, ele que era tudo, era dela. Ela buscava forças em sua razão para encará-lo, mas sabia que seus cálculos a trairiam novamente. Um duelo se aproximava.
Lia se concentrou, precisava livrar-se dele, deveria haver um jeito. Mas a dor não a deixava pensar, não mais, ela só podia sentir. Tivera de desacostumar-se a sentir, pois havia de ser lógica! Ela que cinzenta procurava soluções em sua razão, desatinada de cólera, era obrigada a sentir. E todas as sensações das quais se poupara durante a vida explodiram uníssonas naquele instante.
E era um instante sem fim. Ele crescia. Ele subtraia o ela diminuta. Eles se encararam. Ali segundos pareciam anos, quando o silencio reinava, rosnando num canto, periclitante, incomodado. Até mesmo o ar se encolhia, sobressaltado.
Olhos a fitavam, esses olhos pesados. Olhos a despindo friamente. Nada escapava àqueles olhos negros tão sérios, nem um traço de seu corpo, nem uma mancha de sua alma. Ele a conhecia bem, mas o que queria? Dominá-la? Por um momento ela teve medo, sentiu todo seu pesar, era fluído e pesava. Quis perder os sentidos, desmaiar. Mas estava presa àqueles olhos, que a vasculhavam. Era inquietante a tensão, e ele frio, a paz de um morto. Ela revirada, dissecada. Os olhos já tão profundos, que ela não possuía alma suficiente, tudo transbordava. Então, ele sorriu. Um sorriso tão grande, se ria dela. Via-se suas gengivas vermelhas cínicas, o desprezo estampado. Ele olhava e sorria, algo errado ali. Não condiziam as duas ações, eram como dois quadros sobrepostos. Ele mentia? Mas quem? Os olhos ou o sorriso?
A verdade é que ele a fascinava, como sempre. Lia entendeu, não admitiu e guardou para si. Os olhos brilhavam tanto, como se soubessem toda a verdade, como se quisessem engoli-la por inteiro. Por que não a deixavam em paz? Por que olhar com toda essa atenção, quase como se ela o importasse. Doía tanto. E a dor a nauseava, ela cairia a qualquer momento. Então fechou os olhos. Na escuridão ela se viu sem alma, sim, ele há muito tempo já a havia roubado. Verdade que ela fingia não notar, era condescendente com ele enquanto mentia para si. Ela mentiu todo o tempo, pobre Lia, precisara reprimir a dor. Abriu os olhos. Não havia um passado nem um presente, era como se ela nunca tivesse existido. Seu corpo inteiro estava frio.
Ele também já não era o mesmo. Seu sorriso se alongava nos cantos, se tornava gentil. Seus olhos ganhavam vida, percebia-se até a frivolidade quando ele piscou. De repente, aquele sorriso brilhante se acercou de sua boca, ela quase pode tocar toda a ternura. Seu hálito de mar salgado embriagava, ela absorta seguia as ondas da compassada respiração dele. Um abraço a envolveu, firme. E nesse instante que a surpreendeu, ela sentiu-se completa, pela primeira vez em sua vida. Um beijo! Lia nunca beijara. O beijo era quente, e seu corpo todo agora experimentava. Seus sentidos todos como que de um longo sono despertavam. Seu corpo queria, precisava ser dominado. Ela o desejava, como nunca. E de pronto, mergulhava-se nele. Um grito, cálido como um sussurro, escapou de sua boca e selou o pacto. Ela o amava.
Já cansada, exausta, tentou pôr as idéias em ordem. Foi uma vida, uma vida inteira. Ela não achou grandes respostas. Nada fazia sentido. Ele calor, ela frio. Era incrível, mas eles já não eram dois. Os laços desfeitos, eis que ela era o elo fraco! Nela não mais existia a necessidade de separar coisas, tudo parecia simples e, no entanto, satisfatório. Mas não queria pensar, a dor passava. passava. Estava feito.
Pegou caneta e papel. Estranhou __ lembrava-se de já ter escrito muito, mas ali estava, papel em branco a lhe encarar. “Não havia culpa, fora justo!” convencia-se aqui e ali com certa piedade. Aquela ausência de palavras o exauria, e mesmo sabendo da irremediável tarefa que tinha pela frente, deixou-se derramar na inércia. Seu olhar débil mirava a folha, como que esperando que os minutos levassem consigo o que chamava de “seu dever”. E distraia-se muito bem, quando de súbito foi atingido. Um susto! Algo que vislumbrou o arrancara de seu transe... espiou desconfiado por cima dos ombros, não havia ninguém. Aprumou-se a buscar o papel, que estava ali, nenhuma linha. Seu olhar tornou-se cortante, decisivo; e com um lastimoso suspiro, escreveu. Os olhos ardendo. Pulso pungindo. Ele escreveu sobre ela. E muitos eram os motivos, afinal, era sua despedida.

sábado, 7 de março de 2009

Rosa em botão


Eu vivo de instantes. Hoje eu sou uma rosa, rosa em botão. Eu sinto que ainda não desabrochei. E não vivi. Não criei raízes nem fiz grandes viagens, eu procuro em mim as respostas. Já gostei de rosas, cravos, e o Sol parecia promissor, um amigo. Todos estamos abaixo do céu, mas eu, superficial, não acredito mais em girassóis.

Sou uma rosa que ainda não encontrou seu perfume. Preciso me certificar de que realmente o tenho. Pois eu sou uma rosa que não caibo em mim, eu quero o mundo e eu não tenho nem um jardim. Não há conformidade em ser rosa em botão. Vem a brisa em tédio e a dormência me enlouquece.

E me fecho mais em mim para ninguém ver a dor, para escondê-la do Sol. O Sol não me diz nada, me engana. Não compreendi as indicações, perdi os caminhos. Sim perdida, alguém sem Sol.

Eu sou uma rosa sem cor. As cores vibrantes de mim eu perdi, deixei que a brisa as levassem aos poucos. E me percebo assim, pálida, branca e em botão. O que veio dar errado comigo que não sei florescer. Que não sei ser rosa.

Eu sou uma rosa despedaçada, ainda selada à vida, porém protegida. É que eu tenho espinhos fortes e pontiagudos, os espinhos me protegem de tudo que eu queria para mim, tudo que eu não vivi.

É irônico ser rosa, a fragilidade e a força em fusão. Eu sou rosa que morre a esperar, e a cada dia eu perco uma pétala. Existe em mim uma certeza inquietante de que a vida não vai me colher.

Eu vivo e morro a cada dia imersa em um conflito: o de ser uma rosa simplesmente especial ou de nem rosa ser.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Das rosas
















Nada como ser rosa na vida
Rosa mesmo ou mesmo rosa mulher
Todos querem muito bem a rosa
Quero eu ....

Todo mundo também quer
Um amigo meu disse que em samba
Canta-se melhor flor e mulher
E eu que tenho rosas como tema
Canto no compasso que quiser
(Dorival Caymmi)


Eu sou uma rosa que escreve em prosa e verso. Não se trata de uma nova identidade, nem um tema obstinado. Talvez uma metáfora em mim.
Rosas tem um valor de sentido plural. Eu quero extrair o lirismo das rosas. Eu quero entender o mundo a partir das rosas.

Rosa para mim é poesia, e assim também é esse blog.
Então vamos trocar poesias???